CHUVA PAULISTANA

Era mais um daqueles dias em que a chuva parecia não dar trégua em São Paulo. Eu caminhava apressado pela Avenida Paulista, tentando me proteger com um guarda-chuva quebrado. Enquanto aguardava o farol de pedestre abrir, olhei ao redor a fim de ver quantas pessoas havia na mesma situação que eu. Foi então que vi uma garota atraente parada alguns metros atrás, com um guarda-chuva grande e vermelho, destacando-se entre as demais pessoas.

Ela se aproximou sorrindo e me perguntou se eu precisava de uma carona. Agradeci e aceitei o convite. O meu guarda-chuva estava com duas hastes soltas, eu com as costas molhadas, e não podia recusar à gentileza. A garota passou o braço entre o meu e fomos caminhando juntos. Finalmente, ela quebrou o gelo e perguntou o que eu fazia. Respondi que sou contador e devolvi a pergunta.

Ela riu e respondeu sem nenhum constrangimento:

“Sou garota de programa”.

Fiquei um pouco surpreso, mas não deixei transparecer.

“E como está sendo o trabalho nesses dias de chuva?”, perguntei, sem saber ao certo o que dizer diante da resposta inusitada.

Ela riu. 

“Nos últimos dias mal estou fazendo pra pagar as contas. A chuva não dá uma trégua, aí já viu, né…”

Continuamos conversando e rindo juntos. Ela disse ter alguns clientes fixos, mas que a renda desses programas não era suficiente para pagar todas as despesas e, após uma suspirada longa, concluiu que pretendia se prostituir apenas até concluir o curso na faculdade de administração.

Não tinha como eu saber até onde a história era verdadeira, mas atiçou ainda mais a minha curiosidade. Era a primeira vez que eu conversava com uma garota de programa e fiquei curioso, querendo saber mais.

“Você já saiu com algum famoso?” Perguntei.

Ela sorriu e acenou positivamente com a cabeça.

“Ah, sim! Já atendi alguns, só não posso revelar nomes”, ela disse, piscando um olho.

Rimos juntos e eu comecei a me sentir atraído por ela. Enquanto a gente caminhava, eu senti as curvas do corpo da garota roçando na minha coxa. Era o momento ideal para em propor um encontro mais íntimo, entretanto a lembrança da minha esposa grávida me fez desistir. Ao invés do motel, propus um café e ela aceitou. Ficamos sentados por mais de uma hora, conversando sobre assuntos banais e dando risada da vida. E eu me senti ainda mais atraído por ela. Mas, antes que cedesse à tentação, pedi a conta.

“Camila, realmente foi um prazer ter conhecido você”, disse ao nos despedirmos na porta da cafeteria.

Ela se aproximou de mim e me deu um beijo na bochecha, próximo à minha boca. “Quem sabe a gente não se encontra de novo em um dia de chuva forte como esse?”

Concordei com a cabeça e fiquei parado, com um sorriso no rosto e pensando em como as coisas são imprevisíveis. Quem diria que eu teria um encontro tão divertido e excitante com uma garota de programa em um dia de chuva forte em São Paulo? Talvez a vida seja mais interessante do que imaginamos.

Fiquei observando até ela virar a esquina e desaparecer. E senti uma ponta de saudade. Talvez nos encontrássemos de novo para rir juntos das ironias da vida. E, quem sabe, deixar rolar algo a mais além de um café.

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