Pense em uma mulher mal-humorada? Pensou? Fátima era assim. Maltratava a empregada, ralhava com os prestadores de serviço por motivos banais, xingava o carteiro por ter amassado suas cartas e buzinava sem motivo para qualquer motorista que entrasse em sua frente. Só não destratava o gerente da agência onde tinha conta, porque apesar de ter ficado com uma boa quantia na conta após o falecimento do marido, ela não tinha a mínima noção de como trabalhar com dinheiro e precisava da assessoria do gerente. Ainda assim, como a dita cuja mantinha uma conta rechonchuda na agência, o Aderbal costumava colocar o rabo no meio das pernas, e a tratava como ela gostava de ser tratada. Conforme já dito, a mulher tinha dinheiro, mas não tinha educação financeira. Pensava que dinheiro na caderneta de poupança tinha alguma rentabilidade, sem se atentar que a inflação abocanhava de forma agressiva os juros que a poupança lhe rendia. E, como gerente trabalha para o banco e não para o cliente, com seu jeito submisso e solícito, Aderbal conseguia investir o dinheiro da cliente da forma que lhe era mais interessante.
Além do mau humor, a chatice da criatura era potencializada pelas constantes reclamações de mau cheiro. Sempre reclamava de fedor, fosse na loja onde estivesse fazendo compras, fosse no restaurante, onde fazia questão de conhecer a cozinha a fim de ver se a comida não estava estragada. Na agência bancária o gerente já sabia do problema da mulher e por conta disso deixava sob sua mesa um frasco de desodorante de ambiente. Quando ela chegava, ele enfiava a mão sob a mesa e liberava o odor.
Ela sofria com sinusite e seu nariz avantajado estava sempre com a ponta vermelha. Gotejava o tempo todo e a todo instante ela precisava enxugá-lo com um lencinho de papel. Talvez isso explique um pouco de seu constante mau humor.
Certo dia Fátima ligou para a agência avisando que iria fazer uma visita ao gerente a fim de verificar os investimentos. Aderbal passou álcool na mesa e ajeitou todos os papéis no escaninho. Queria deixar tudo limpo e em ordem para impressionar sua cliente VIP. Ocorre que devido a uma crise de labirintite, ele precisou deixar o trabalho para ir ao médico. Quem ficou em seu lugar foi o gerente adjunto, que não sabia das manias da mulher.
Fátima já adentrou a agência fungando a fim de detectar algum odor e se dirigiu à mesa do gerente. Fabrício gentilmente se pôs de pé e com um sorriso cortês, esticou a mão e indicou a cadeira para a cliente.
“Meu gerente não se encontra?”, indagou entre uma fungada e outra, movendo observando ao seu redor.
Fabrício explicou o ocorrido e se colocou à disposição para ajudar no que fosse preciso, mas a mulher franziu o cenho, fez uma expressão de desdém. Ainda assim sentou-se, impaciente.
“Preciso de informações sobre meus investimentos.”
Rapidamente Fabrício acessou os dados da conta da mulher e virou o monitor de modo que ela conseguisse enxergar a tela. Era uma tela grande, de 20 polegadas, mas Fátima meneou a cabeça e torceu a boca para o lado.
“Nem adianta me mostrar. Não entendo nada do que aparece aí!”
Fabrício deu um sorriso e concordou com a cabeça. Apenas eles conseguem identificar as informações na tela preta com letras verdes do sistema utilizado pelo banco, e ele sabia disso.
“Estão precisando limpar essa agência,” resmungou ela enquanto fungava e esticava o olhar para baixo da mesa do gerente. “O odor não está muito agradável por aqui.”
Fabrício sentiu seu rosto pegar fogo naquele instante. O rapaz era loiro e ficou com as bochechas mais vermelhas do que as bochechas do Papai Noel. Disfarçadamente, ele puxou o pé para trás e deu uma mirada na sola do sapato. Mas estavam limpas. Lançou um olhar desconfiado a fim de ver se alguém havia escutado a queixa da cliente. Um dos seguranças olhava de canto de olho, com um sorriso maroto na boca. O estagiário sentado na mesa ao lado, também estava com as bochechas vermelhas, segurando o sorriso, o que aumentou o constrangimento de Fabrício.
Ele se desculpou e informou que ia reclamar com a equipe da limpeza. Depois mandou imprimir uns papéis e apresentou à cliente.
“De fato precisa pegar no pé da pessoa responsável pela limpeza. O cheiro está horrível!” Reclamou novamente a cliente.
Fabrício não sabia onde enfiar a cara. Bastou ele começar a falar, que a mulher reclamou do mau cheiro. Será que ele estava com mau hálito? Ele ficou encucado. Enfiou uma bala de menta na boca, informou rapidamente para a cliente sobre a situação financeira e desculpou-se que precisaria sair para uma visita externa.
Quando a cliente saiu pela porta giratória da agência, tanto o segurança quando o estagiário, não conseguiram se segurar. Eles olharam um para o outro e começaram a dar risada. Fabrício sorriu acanhado, sem entender o motivo da graça, e perguntou o que estava havendo. Foi aí que eles contaram sobre o problema da cliente com a sinusite e sobre a artimanha do gerente titular com o desodorante de ambiente sob a mesa a fim de ludibriá-la.
No mês seguinte Aderbal entraria de férias e novamente Fabrício assumiria seu lugar durante sua ausência. Como as visitas de Fátima ocorriam uma vez por mês, a próxima vez que ela voltasse na agência, seria ele que a atenderia de novo. E foi aí que ele teve a ideia de se vingar da cliente desaforada. Só precisava descobrir o melhor jeito.
Naquela noite Fabrício voltou para casa maquinando o plano. Perdeu até o sono de noite tentando imaginar um jeito de se vingar da cliente sem ser culpado pela arte. Já se passava da meia-noite quando uma ideia lhe veio à mente.
No mês seguinte, como já esperado, Aderbal entrou de férias e Fátima, sem saber das férias do gerente capacho, ligou avisando que iria até a agência verificar seus investimentos.
Era a oportunidade de Fabrício colocar seu plano em prática. Quando ele a viu se aproximar, prontamente ele se pôs de pé e foi ao encontro dela. E a mulher, percebendo a postura solícita do gerente adjunto, deixou escapulir um sorriso de satisfação.
“Aderbal não se encontra novamente, né?”
Fabrício informou que o gerente havia pego férias, mas garantiu que havia sido instruído acerca das movimentações bancárias da cliente e que estava a par do que ela precisava. Perguntou se ela aceitava um café e diante da resposta afirmativa, ele puxou a cadeira para ela se sentar e, ao mesmo tempo, pediu ao estagiário para buscar o café para a cliente. Assim, ludibriada pelo gerente adjunto, ela olhou para o rapaz e sentou sem olhar para o assento.
Quando o estagiário chegou com o café, ela levantou a xícara e deu uma olhada no pires. Depois levou a xícara até o nariz e deu uma fungada. Fabrício arregalou os olhos, coçou a testa e olhou de rabo de olho para o estagiário, que agora já estava sentado novamente em sua mesa.
“Chegou a reclamar com a equipe de limpeza?”, indagou ela. “Estou sentindo o mesmo cheiro desagradável que senti da outra vez que estive aqui.”
“Claro, claro. Inclusive estamos com uma nova equipe. Bem mais cuidadosa, posso lhe garantir.”
Ela franziu a testa e deu um gole no café, seguido de nova fungada.
“Então vai precisar reclamar de novo. O fedor está horrível!”
Fabrício sabia que o problema estava no nariz da mulher, mas, sem delongas, fez a revelação:
“Eu realmente não sei como lhe dizer isso, dona Fátima, mas”, ele coçou a testa, fazendo-se de constrangido, “quando a senhora chegou percebi que havia uma sujeirinha em sua saia.”
Ela deu um tapa sobre a mesa e se pôs de pé.
“Está insinuando que estou com a roupa suja, rapaz?”
Fabrício apertou os lábios e assentiu com a cabeça de forma tímida.
“Não disse nada para não deixá-la constrangida, mas se quiser pode usar nosso banheiro a fim de ver sua saia.”
A mulher já estava lançando faísca pelos olhos. Lançou um olhar rápido pela agência, fungou outra vez, e passou a mão atrás da saia, enquanto Fabrício a observava com os olhos arregalados. Foi aí que sua vingança se completou. A mão de Fátima ficou lambuzada com uma substância cor de amêndoa e ela, com uma expressão de espanto, levou a mão perto do nariz. Para qualquer pessoa, o odor era de creme de amendoim, mas para Fátima com sua sinusite crônica, o fedor era de fezes. A mulher começou a tremer, as bochechas ruborizaram e o nariz adunco começou a escorrer ainda mais. Fabrício cobriu a boca com a mão cerrada e lançou um olhar na direção do segurança, que nesse momento já estava gargalhando.
Fátima deixou a agência às pressas, vermelha de vergonha, sem olhar para os lados, com uma mão cobrindo a fronte e a outra segurando a saia. Após a saída da cliente, Fabrício riu gostoso com o segurança e com o estagiário, mas não deixou escapar que aquilo fazia parte de sua vingança. E nem podia, caso contrário seria demitido por justa causa e nunca mais conseguiria emprego em banco. Depois chamou a moça da limpeza e constatou-se que a sujeira era apenas creme de amendoim.
Sorrateiramente, Fabrício havia lambuzado o assento da cadeira com creme de amendoim, mas todos pensaram que a cliente mal-humorada já houvesse chegado à agência com a saia suja. E a cliente, que em tudo sentia fedor e que a todos constrangia sem nenhuma cerimônia, saiu da agência envergonhada, imaginando estar com a saia suja de de merda.