GOLPE DO PIX

“Seguinte, eu não sou o sargento Paulo coisa nenhuma, só falei isso, pra sua recepcionista passar a ligação pra você. Escuta bem, faz o que eu vou te mandar e ninguém vai sair machucado!” Nesse instante ele levantou o tom da voz. “Eu tô aqui na frente do seu estúdio, Alameda Rio Claro, número X. Não é esse o seu endereço? Ou você faz um pix agora, ou a gente vai entrar e matar todo mundo!” 

A voz do outro lado da linha era grave e intimidadora.

“Agora faz essa porra logo, ou todo mundo aí dentro vai morrer!” Continuou a ameaça. “Faz o pix logo, porque não tô de brincadeira, não, maluco. Quanto mais rápido você fizer, mais rápido te deixo em paz, caso contrário você tá fodido!”

“Calma… calma aí que vou ligar o computador,” respondi querendo ganhar tempo.

“Calma o caralho! Faz essa porra logo e nem pensa em chamar a polícia!” 

Não pensei em mim naquele instante, porque eu estava na minha sala, observando as entradas frontal e lateral pelas câmeras. Meu receio era chegar algum cliente e os bandidos abordá-lo.

“Cara, não vou chamar a polícia, pode ficar tranquilo,” respondi procurando manter a calma. “O computador tá pesado… muitos programas iniciam com o sistema… vou precisar fechar todos eles, mas já vou abrir o site do banco.”

“E por que você não usa a porra do celular? É só abrir o aplicativo e fazer o pix,” gritou ele do outro lado, com a voz alterada.

Desculpei que o celular não era habilitado para esse tipo de transação.

“Só consigo pelo site do banco, mas calma, aí… Já estou abrindo, só um minuto.”

Nesse instante, a minha assistente entrou na sala. Coloquei o telefone no mute e pedi para ela ligar para a polícia e avisar o que estava acontecendo. As câmeras laterais me permitem ver apenas as entradas dos portões, por isso não tinha como saber se realmente havia algum bandido do outro lado da rua aguardando para invadir.

Procurei manter a voz calma e tentei prolongar a conversa a fim de conseguir a chave pix do bandido, talvez a informação pudesse ser útil para a polícia. 

“Ô, filho da puta, faz logo essa porra!” Gritou ele. “Já te falei que vamos entrar aí e matar todo mundo! Deixa de ser burro e abre logo essa porra, porque a sua vida vale muito mais do isso!”

O cara do outro lado não conseguia falar uma frase sem dizer um palavrão. 

“Meu celular não faz pix… ele é bloqueado pra esse tipo de operação.” 

Comecei a bater os dedos sobre as teclas do teclado, como se estiver digitando. 

Quando a minha assistente terminou de falar com a polícia, pedi que ela fosse até a janela a fim de verificar se de fato havia indivíduos do outro lado da rua. 

“Já estou abrindo o internet banking, só mais um minuto.”

“Mano, não tô brincando. Já disse que tem dois motoqueiros de capacete parados na esquina e se você chamar a polícia, a gente vai entrar aí e você vai ser o primeiro a morrer!”

Dessa vez ele não soltou nenhum palavrão, apenas fez a ameaça. Entretanto, as ameaças e palavrões eram tão frequentes que por um instante cheguei a considerar a veracidade do que ele dizia. O bandido soltava uma palavra atrás da outra, um palavrão seguido de uma ameaça, sem fazer pausas e sem dar tempo para eu raciocinar. É a tática que eles usam, porque assim muitas pessoas ficam apavoradas e acabam caindo no golpe.

Instantes depois a minha assistente retornou e fez um sinal avisando que não havia ninguém na frente do estabelecimento. Diante da informação, bati o telefone e liguei para a polícia. Informei a gravidade das ameaças e demonstrei estar apavorado, a fim de despertar a compaixão da atendente do outro lado da linha.

“Procure ficar calmo, senhor Claudio,” disse a mulher. “Vou solicitar uma viatura de forma prioritária,” prometeu.

As conversas se espalham rápido e os clientes que estavam no estabelecimento já estavam sabendo do ocorrido. Desci até a recepção e procurei não transparecer a meu nervosismo. Mesmo sabendo se tratar de golpe do pix, eu nunca ouvi tantas ameaças e desaforos e a tensão era natural naquele momento.

Dez minutos depois, um carro estacionou em frente, devia ser a polícia. Senti uma sensação de alívio. De certa forma, me senti protegido. Mas era um Uber que havia ido pegar algum passageiro na calçada.

Sentei novamente, entrei no grupo de vizinhos do WhatsApp e relatei o ocorrido para os demais participantes. Fui informado que outros dois lojistas receberam a mesma ligação naquela manhã. Enquanto conversava pelo aplicativo, tomei duas ou três xícaras de café e, aos poucos, fui relaxando. Quando percebi, já havia decorrido mais de meia-hora. 

Chegou uma cliente, depois outra e ficamos conversando sobre viagens e vinhos, e a conversa se estendeu de forma agradável, me fazendo esquecer a tensão e rir das ameaças que eu havia recebido.

O restante do dia transcorreu sem maiores complicações, tudo na santa paz de Deus. Às sete horas da noite, não havia mais cliente no estabelecimento e encerramos o expediente. Um pouco temeroso, apontei a cabeça para fora a fim de ver se havia algum indivíduo estranho parado nas proximidades, mas não avistei ninguém. Nenhum bandido, nenhum cachorro, nenhum policial, apenas alguns carros passando em uma ou outra direção. 

Aliás, se o bandido fosse real, eu não estaria aqui escrevendo este relato, pois nenhum policial ou viatura foi até o local. Talvez a polícia tivesse encontrado outra ocorrência de maior gravidade, talvez a viatura tivesse quebrado, talvez os policiais tivessem parado na padaria da outra esquina para tomar um cafezinho. São tantos talvezes que nunca tem como saber…

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