BOLAS GRANDES, BOLAS PEQUENAS

Após quase uma eternidade de espera, eis que surge o Sandero prata. Como de praxe, ocupei meu lugar cativo no banco da frente. Porém, essa opção revelou-se um tanto quanto questionável. Como todo bom condutor de aplicativo, o motorista tinha uma habilidade inata para o bate-papo e, sem cerimônias, soltou a pergunta clássica: “E aí, tudo bem? Qual o motivo da visita ao hospital?”

Confesso que não me recordo exatamente da minha resposta, apenas sei que não abri o jogo sobre a recente postectomia. Optei pelo silêncio por duas razões óbvias: revelar o real motivo poderia desencadear duas perguntas inevitáveis. Em primeiro lugar, ele indagaria sobre o que raios é postectomia. Em segundo, a temida pergunta sobre a temível fimose. Soltei uma resposta rápida e me calei, deixando-o, em seguida, despejar sua vida como se estivesse participando de uma maratona verbal.

Em poucos minutos, já me tornei íntimo do motorista. O cara era um engenheiro elétrico, produto da respeitada universidade federal em Alfenas. Além disso, ostentava o título de marido e pai de dois rebentos, tudo isso enquanto liderava uma congregação da Assembleia de Deus.

Tentei, em vão, mergulhar na conversa, mas uma preocupação inusitada roubava a cena: a insensibilidade do meu pau. Meu “órgão” parecia completamente mudo, e o cirurgião, mesmo sendo um nome conhecido em São Paulo, deixou uns buracos no script pós-operatório, especialmente sobre esse drama da falta de sensibilidade. Como já mencionei, isso estava me deixando inquieto. Afinal, nunca fui protagonista de um episódio cirúrgico e não tinha ideia de quanto tempo duraria esse “mutismo genital” pós-anestesia.

Enquanto a viagem seguia seus caminhos asfaltados, percebi que o motorista estava fazendo uma coreografia peculiar na região do zíper. Ele acariciava o pau dele com certa insistência. Em um momento, lançou um sorriso na minha direção, revelando uma fileira de dentes alinhados, mas com um tom amarelado de quem talvez exagerou no cigarro.

Seu olhar, meio insinuante, percorreu meu corpo e parou na minha mão. Foi aí que me dei conta de que, sem perceber, eu também estava dando uma de maestro particular na região genital. O motorista, interpretando isso como um convite, não perdeu tempo.

“Tomei uma bolada no saco enquanto jogava bola com uns camaradas”, soltei a pérola da desculpa. “Agora, tá doendo pra caralho!” encerrei a mentira.

O motorista, visivelmente desconcertado, soltou um suspiro profundo e balançou a cabeça. “Eu costumava bater uma bola quando era jovem, era zagueiro”, confessou, olhando para os retrovisores como se estivesse procurando uma fuga. “Mas depois a minha miopia foi piorando até o uso dos óculos se tornar obrigatório, depois disso, a bola grande nunca mais fez parte da minha vida… pelo menos não bola a de futebol.”

Ao mudar de faixa, ele soltou um sorriso sacana e concluiu: “Agora só bato bolo e jogo apenas com bolas menores, em lugares menos abertos.” 

Lá estava eu, com a capacidade de raciocínio capengando por causa do efeito da anestesia e tentando decifrar qual esporte de “bolas menores” ele estava se referindo. Será que o cara tinha se entregado ao charme do pingue-pongue ou estava dominando as tábuas verdes da sinuca? Afinal, na vida, é como se estivéssemos numa eterna caça ao tesouro esportivo, sem saber quais jogos inusitados estão sendo praticados por aí! 

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